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“Queremos chegar a mil refugiados contratados nos próximos quatro anos”

São diversos os estudos que revelam maior atenção por parte das empresas em relação ao assunto.

O cenário da diversidade, da equidade e da inclusão vem ganhando cada vez mais força no mercado brasileiro. São diversos os estudos que revelam maior atenção por parte das empresas em relação ao assunto. Um deles é a Pesquisa Benchmarking: Panorama das Estratégias de Diversidade no Brasil 2022 e Tendências para 2023, que identificou que 81% das marcas presentes destinam verba para ações de DE&I.

Apesar do crescimento das iniciativas, alguns públicos ainda são marginalizados no país quando a questão é conseguir uma oportunidade de trabalho. No recorte dos refugiados, por exemplo, dados do relatório Mercado de Trabalho para Pessoas Refugiadas no Brasil, realizado pelo Colettivo, em parceria com o Fórum Empresas com Refugiados, mostram que 55% das pessoas refugiadas não têm emprego por aqui. Daquelas que possuem, segundo a ACNUR (Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados) e o Vagas.com, em outro estudo, nem 15% contam com registro formal.

No meio de um panorama pouco acolhedor, não são muitas as empresas que têm o foco de suas iniciativas de DE&I voltado aos refugiados. Barreiras culturais e linguísticas somadas à burocracia em torno das contratações são fatores que desestimulam as organizações.

Do outro lado da moeda, no entanto, há companhias com ações sólidas e inspiradoras que não apenas acolhem esse público, como também abrem as portas para o desenvolvimento de sua carreira. É o caso da Foundever, uma das empresas de maior reconhecimento no Brasil pelo seu trabalho com refugiados.

Em entrevista para o RH Pra Você, Adriana Wells (capa), Diretora de RH e ESG, trouxe todos os detalhes que fazem da marca uma referência em inclusão de pessoas. Confira:

RPV: Como é o trabalho de DE&I na Foundever e como começou o projeto de contratação de refugiados?

Adriana: O primeiro público que podemos considerar como inclusivo [no foco de projetos] foi o dos refugiados, pois há anos demos início nas contratações. Normalmente, as empresas começam suas ações de inclusão com outros públicos, como o feminino, mas nós partimos diretamente para as pessoas refugiadas. Hoje, temos muitas iniciativas voltadas à conscientização e ao aculturamento do nosso público.

A Foundever tem um modelo hierárquico diferenciado. Isso parte do princípio da nossa missão, que é make things simple (simplifique as coisas). Isso nos move a quebrar o modelo engessado de muitas empresas. O primeiro ponto, então, é sermos acessíveis desde a base, sabendo transitar em todos os cargos. A pirâmide é reversa, quem tem que estar no tapete vermelho é o agente de atendimento.

Essa visão hierárquica mais disruptiva e flexível permite que façamos uma jogada reversa. A estratégia de inserção e contratação de pessoas em grupos subvalorizados foi “começar“. As pessoas perguntam como eu fiz e respondo: “comecei começando“. E depois parti para o aculturamento.

O programa não começou comigo, mas fui a responsável por criar uma jornada adaptada. Quando eu cheguei, tive que ser mediadora de conflito por um bom tempo. As contratações eram feitas sem se pensar na jornada.

RPV: Que mudanças isso trouxe?

Adriana: Para lidar com mudanças, tivemos que mexer com a zona de conforto. Começamos a contratar e, a partir deste momento, o passo seguinte foi preparar a liderança. Isso foi muito bom. Nisso, começamos a criar formatos que facilitassem a relação entre líder e liderado.

Quando tenho, por exemplo, um refugiado no processo seletivo ou no treinamento, é entregue ao supervisor uma cartilha com dicas e cuidados que ele precisa ter para recepcionar a pessoa refugiada.

RPV: A barreira linguística não atrapalha esse processo?

Adriana: Como a barreira linguística é um problema, o que a Foundever faz? Não coloca uma, independentemente deles falarem português ou não, porque para nossas posições o idioma não será usado. Então, o líder é quem precisa ter o idioma do refugiado. A barreira deve ser adaptada para o nosso time.

Implementamos um departamento de idiomas com language academy para os brasileiros que se relacionam com os refugiados. Eles aprendem espanhol, porque a maioria dos refugiados que contratamos é da Venezuela. 100% do time que interage com eles deve saber falar espanhol.

RPV: Existe também um processo educacional voltado aos refugiados?

Adriana: Há dois anos, passamos a promover também o português. Apesar do emprego não exigir o idioma, eles vivem no Brasil. É importante aprender e isso cria uma consciência cultural para que eles socializem.

Nosso Departamento Pessoal, em espanhol, ensina aos refugiados quais são as leis trabalhistas no Brasil e quais são os seus direitos profissionais.

E se eu tenho, por exemplo, um treinamento aplicado por um colaborador argentino a um venezuelano, há também um trabalho educacional para que sejam compreendidas as variáveis linguísticas. Em comparação, é como o nosso português em relação ao de Portugal.

RPV: Hoje há quantos refugiados na empresa?

Adriana: Quando eu cheguei – em 2019 –, havia mais de 100. Com a pandemia, o número aumentou consideravelmente, pois o processo seletivo remoto foi um facilitador – antes fazíamos o recrutamento na fronteira, o que estreitou nosso relacionamento com ONGs, igrejas e também a ACNUR. Hoje, nós temos 640 refugiados.

Temos o compromisso de, em quatro anos, aumentar em 400 o nosso headcount. Queremos chegar a mil refugiados. Já temos para 2024 duas feiras planejadas para esse público. A ideia é fazer esses feirões para que possamos não só dar dicas de confecção de currículo, mas para fazer a trilha do processo seletivo.

RPV: O quanto a contratação da população refugiada impacta o trabalho do RH de vocês?

Adriana: Como RH, entendemos que seria necessário permitir uma jornada extremamente customizada. Como cultura, nosso objetivo é fazer com que nossos colaboradores se sintam bem-vindos, seguros e felizes por serem quem eles são.

Partindo desse mantra, começamos a olhar cada categoria de grupos subvalorizados para entender como podemos adaptar a jornada. Temos um calendário de DE&I, com o qual buscamos identificar como está sendo a experiência do colaborador.

Nossa diversidade não fica no discurso. Se andarem por nossos corredores, serão vistas pessoas muito diferentes. O RH tem a missão de promover, cuidar, abraçar, aculturar e auditar a questão das diferenças.

RPV: E isso com a participação direta dos públicos atendidos ou com o RH tomando todas as iniciativas?

Adriana: Temos um comitê de diversidade e inclusão por onde, através da ótica dos diferentes públicos, é sugerido como podemos transformar as jornadas. A partir disso, criamos cartilhas de educação e aculturamento para as lideranças e para a companhia como um todo.

Somos o espelho da comunidade, mas ela é, muitas vezes, intolerante. Então, o nosso papel como empresa é desenvolver essa tolerância à diferença. Somos uma empresa de contact center que conta com muitos públicos. As diferenças são valores agregados que somam como potência para os nossos colaboradores.

Percebemos que não podemos tratar as pessoas como iguais, porque nós não somos. O que temos que fazer é proporcionar oportunidades iguais.

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